Como os jogos se transformaram de produtos em serviços

As últimas semanas trouxeram à tona o movimento Stop Killing Games, uma iniciativa de consumidores que estão realmente cansados da situação atual na indústria de jogos. O foco da insatisfação é a necessidade constante de estar conectado à internet, o que pode tornar jogos totalmente injogáveis quando os servidores são desligados.
Se olharmos para a história, vai perceber que, nos anos 2000, os jogos eram vistos como produtos. Mas, atualmente, a maioria deles se aproxima mais de serviços. Essa mudança começou com a popularização do modo multiplayer, que levou as empresas a desenvolverem serviços de conexão entre jogadores. Com o tempo, isso evoluiu para títulos online com expansões, uma mistura de produto e serviço. Mas como e por que essa transição aconteceu?
O Nome Diz Tudo
Conforme Jacob Navok observou em uma discussão recente, há cerca de quinze anos, os relatórios anuais da Square Enix falavam constantemente de produtos. Essa palavra, traduzida do japonês, significa "conteúdo". Por exemplo, um jogo como Warcraft III era considerado um produto completo, enquanto Esquadrão Suicida: Mate a Liga da Justiça é enquadrado como um serviço. No entanto, isso não significa que não haja bons exemplos de títulos dessa nova geração, como Helldivers 2.
Como a diferença de nomenclatura reflete a realidade, o primeiro jogo era um produto que, uma vez comprado, podia ser jogado a qualquer momento. Já um jogo que exige conexão constante pode parecer mais um serviço. Basicamente, ao adquirir um desses jogos, o jogador está comprando uma licença para jogar, desde que os servidores permaneçam ativos.
E, para complicar ainda mais, muitas mídias físicas vêm apenas com uma chave de ativação, ao invés do jogo em si. Isso transforma a experiência de compra.
Escassez
Uma grande alteração que muitos não percebem é que, quando os jogos eram produtos, a indústria operava em um modelo de escassez. O jogador consumia um jogo e partia para o próximo. No cenário atual, especialmente em jogos como World of Warcraft, a "próxima jogada" muitas vezes é uma nova expansão.
Para lucrar, as empresas precisam lançar novos produtos. Isso explica o frenesi em torno das datas de lançamento, mesmo em comparação com a indústria cinematográfica, que também segue essa lógica de escassez.
Contudo, existe um lado da indústria que ainda adota o modelo anterior, principalmente em jogos indies, que estão começando a se inserir em serviços maiores, como o GamePass.
O Futuro Era a Rede
Com o advento da internet a partir dos anos 2000, o mercado de jogos foi se transformando em redes. Um exemplo disso é a Battle.net, lançada em 1996, que ajudou a construir um sistema de conexão. O conceito de rede é importante aqui: segundo a Lei de Metcalfe, o valor de uma rede aumenta conforme o número de usuários conectados cresce. Em termos simples, cada jogador online se torna mais valioso que um disco de jogo vendido.
Consequências Práticas
Essa transformação resulta em consequências diretas para os usuários. Os jogos se tornaram serviços porque as empresas precisam medir quantas pessoas estão conectadas, em vez de apenas vender um produto. Antigamente, um CD podia ser usado em vários computadores, mas agora cada conta é individual, limitando o acesso a uma só vez.
Com a popularização do Wi-Fi e dos jogos em mobile, as empresas começaram a entender o potencial desses modelos. Jogos como Angry Birds também sofreram essa transformação gradual. O que vemos é uma nova forma de se fazer dinheiro, onde o número de jogadores online é mais importante que as vendas.
De Conteúdo para Plataforma
Muitos jogadores que hoje conhecem Minecraft vivenciam essa transformação. O jogo, que começou como um produto, evoluiu para uma verdadeira plataforma criativa, com infinitas possibilidades. Assim, novas gerações de gamers, como os fãs de Roblox, não percebem os jogos como produtos isolados, mas como uma experiência contínua dentro de uma plataforma.
Esse modelo de plataforma se espalhou para outros títulos populares, como Fortnite e GTA Online. O resultado é que a competição por atenção se torna mais difícil para jogos tradicionais.
Difícil de Competir
Jogos que têm uma base de usuários maior, como Fortnite, podem investir mais em conteúdo do que a maioria dos desenvolvedores. Por isso, mesmo que um novo conteúdo não agrade, os jogadores podem sempre retornar ao que já está disponível.
Esse cenário significa que, no mercado atual, os jogos são mais que uma mídia; eles funcionam como plataformas contínuas que podem proporcionar novas experiências. Assim, serviços como o GamePass tornam-se essenciais, enquanto jogos indies podem ser vistos como produtos dentro dessa nova dinâmica.
Cruzando o Rubicão
O mês de junho de 2025 foi uma virada para a indústria. Investimentos de quase US$ 1 bilhão foram feitos em projetos como Mindseye e Splitgate 2, apenas para os lançamentos não saírem como esperado. Isso destaca os riscos gigantescos que as empresas estão assumindo.
Um caso emblemático foi o jogo Concord, que teve uma perda horrenda, sem retorno, mesmo após anos de desenvolvimento. Essa mudança de paradigma no mercado de games indica que uma nova era se aproxima.
O Novo Dilema
Jogadores que se divertem com Roblox continuarão a explorar a plataforma. Assim como as novas gerações que estão sempre conectadas ao YouTube. Esse fenômeno deixa claro que a Lei de Metcalfe se aplica cada vez mais ao mundo dos jogos.
Com a ascensão de novas plataformas, a luta por atenção e investimento só tende a aumentar. O desafio é que as escolhas que as empresas fazem agora podem definir seus sucessos futuros, principalmente em um cenário que exige uma constante adaptação às inovações.
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